Porte de Arma: novo decreto do presidente divide o governo

17 maio | 14 minutos de leitura

Porte de arma assinado em novo decreto gera burburinho 

Uma das primeiras atitudes de Jair Bolsonaro quando assumiu a presidência do Brasil foi facilitar a posse de arma. A promessa, que foi um dos principais motivos pelo qual o presidente foi eleito, já dividia o país ainda na época de campanha, e após o decreto, os favoráveis defendem com unha e carne que a posse de arma é positiva.Porte de Arma: novo decreto do presidente divide o governo

Porte de Arma: novo decreto do presidente divide o governo

Em maio do mesmo ano, Jair Bolsonaro apresentou um novo decreto, dessa vez facilitando o porte de arma para um conjunto de profissões. Advogados, caminhoneiros, políticos eleitos – do presidente da República até os vereadores – oficial de justiça, colecionador ou caçador com certificado, dono de loja de arma ou escola de tiro, residente de área rural, agente de trânsito, conselheiro tutelar, jornalista de cobertura policial, instrutor de tiro ou armeiro, colecionador ou caçador, agente público da área de segurança pública – mesmo que inativo. Essas categorias podem levar suas armas para fora de casa.

Além disso, o decreto também altera as regras sobre importação de armas e sobre o número de cartuchos que podem ser adquiridos por ano – que passam de 50 para 1 mil em caso de armas de uso restrito e 5 mil, nas de uso permitido. Um outro tópico foi a mudança nas armas permitidas. Algumas eram de uso privativo de forças de segurança, como a pistola 9 mm, que só podia ser usada por Exército, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal, e o revólver calibre .40, utilizada por policiais civis e militares.

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Armas liberadas – Imagem retirada do site G1

Também por meio do decreto, agora os menores podem fazer aulas de tiro apenas com uma autorização dos responsáveis legais pelo menor e que o curso seja em local autorizado pelo Comando do Exército, sendo que antes era necessária uma autorização judicial.

A validade para renovação da posse e do porte de arma foi alterada no primeiro decreto, relativo à posse, sendo assim, ambos passam a ter prazo de 10 anos.

De acordo com um levantamento preliminar do Instituto Sou da Paz, cerca de 19,1 milhões de pessoas poderão, após o decreto, ter acesso a armas de forma legal no Brasil. Lembrando que, assim como no decreto para posse de arma, há especificidades que as pessoas precisam possuir para ter o direito.

 

Porte de arma aumenta ações da Taurus

O decreto de Jair Bolsonaro também facilita o registro, a venda e a importação de armas, tornando-a liberada. A indústria brasileira, mesmo com a liberação da importação, ficou satisfeita, pois prevê aumento nas vendas no Brasil.

O presidente da Forjas Taurus, empresa brasileira que produz armas, Salesio Nuhs, afirmou que esse é um grande momento para o segmento no Brasil. “Óbvio que estamos comemorando, porque nos preparamos durante muito tempo para atender uma flexibilização no mercado”, afirmou.

Nuhs também afirmou que a empresa não conseguia diversos modelos de armas, e até linhas completas de produtos, pois eram proibidas. “Há uma demanda reprimida que podemos atender de imediato. Qualquer que seja o percentual – de aumento nas vendas -, temos a condição de atender de imediato”, explica o presidente da Taurus.

De acordo com o portal G1, a fábrica da Taurus no Rio Grande do Sul produz 4 mil unidades por dia. Já na sede dos Estados Unidos, a produção, que era de 400 mil armas por ano, está dobrando de capacidade. No dia em que Jair Bolsonaro sancionou o decreto, dia 08 de maio, as ações da Taurus dispararam na Bovespa, com alta de 23,51%.Porte de Arma: novo decreto do presidente divide o governo

Mas de acordo com o portal Moneytimes, as ações da empresa despencaram no dia 15 de maio, após notícias de que o Ministério Público Federal (MPF) busca a suspensão do decreto, porém vamos falar sobre isso depois. Segundo o portal, os papéis ordinários (FJTA3) recuaram 5,85%, a R$ 3,54 e os preferenciais (FJTA4) despencaram 6,72%, a R$ 3,74.Porte de Arma: novo decreto do presidente divide o governo

 

 

Michel Temer vetou projeto

Em 2017, quando ainda era presidente, Michel Temer vetou o projeto que autorizava o uso de armas por agentes de trânsito. A proposta foi aprovada um mês antes pelo Congresso Nacional, mas vetada por Temer, segundo orientações do Ministério da Justiça. Os agentes aos quais o projeto pretende autorizar aquele porte não exercem atividade de segurança pública e, no caso de risco específico, há possibilidade de se requisitar a força policial para auxílio em seu trabalho“, disse o ministério na época.

 

Os apoiadores do decreto que facilita o porte de arma

O coronel da reserva do Exército Carlos Vella, que é instrutor de tiro, acredita que o decreto seja positivo. “As armas que eram restritas agora são permitidas, foi aumentando o acesso de armas de maior potência às pessoas de bem. A bandidagem usa fuzil, faz pirotecnia. Não é porque o acesso é permitido, que as pessoas vão sair comprando”, explica o oficial.

De acordo com Carlos Vella, para se ter posse e porte de arma, é preciso equilíbrio emocional, fazer um bom curso de tiro, aprender corretamente. “Até porque, em um tiroteio, você terá responsabilidades de não acertar em uma pessoa inocente”, diz.  

Selesio Nuhs, presidente da Taurus, acredita que não haverá risco em função do maior acesso a população a armas de maior calibre. “O calibre não é o mais importante. O mais importante é a responsabilidade que a pessoa tem a se armar, os atos e as consequências que ela tem devido àquela arma. Eu acho uma bobagem tremenda quando falam que quanto mais armas, mais crimes“, afirma o presidente.

Um outro argumento de defesa de Nuhs é que o bandido, antes, tinha certeza de que as pessoas não possuíam armas. “Agora, eles também têm esta dúvida, se a pessoa comprou ou não. E a dúvida beneficia o cidadão.”

Jair Bolsonaro compartilhou o anúncio do decreto em seu Twitter, explicando os motivos da ação. Porte de Arma: novo decreto do presidente divide o governo

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Além disso, o decreto autoriza menores a partir de 14 anos a praticarem tiro esportivo, com autorização dos dois responsáveis.

Além disso, ele informou, em um evento no Rio de Janeiro, sobre os motivos do decreto. “Eu não posso ir além da lei. Tudo que puder ser concedido por decreto nós vamos fazer, até porque estamos cumprindo dessa forma uma manifestação de opinião efetivada em 2005 com o plebiscito, quando a população foi às urnas decidir sobre o direito à legítima defesa”, disse Bolsonaro.

 

Os contrários ao decreto

Muitas pessoas e órgão se manifestaram contrários ao decreto, como o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Segundo ele, “a medida é claramente uma tentativa de driblar o Estatuto do Desarmamento e ignora estudos e evidências que demonstram a ineficiência de se armar civis para tentar coibir a violência em todos os níveis”, explica o órgão.

O coronel José Vicente da Silva Filho, que atuou como secretário Nacional de Segurança Pública no governo de Fernando Henrique Cardoso, também é contra o decreto. “As pessoas terão acesso a praticamente todas as armas portáteis em caráter geral, inclusive as de calibre mais elevado que as polícias usam, como .40. As pessoas vão ter armas, inclusive, que as polícias não têm”.

O coronel ainda afirma que a população ainda pode sofrer com roubo das armas. “O risco é grande de essas armas serem roubadas, levadas. Além disso, vai morrer muito mais gente”. José Vicente prevê que a venda em massa de arma deve gerar, a curto prazo, um aumento de até 20% no número de mortes no país.

O coronel ainda destaca que a quantidade de munições autorizadas também merece atenção. “Os policiais, em treinamento, dão 200 tiros por ano. É muita munição e muita arma. Estamos nos preparando para uma guerra”, afirmou José Vicente.

O Instituto Sou da Paz, representado por Bruno Langeani, diz que o decreto de Bolsonaro, na prática, libera o porte de armas para as categorias citadas no texto, o que dribla a limitação imposta na lei do Estatuto do Desarmamento. “O presidente está legislando por decreto. Há projetos de lei em tramitação no Congresso para dar porte de armas para agente socioeducativo, oficial de Justiça… Se esses projetos estão lá e não foram aprovados, como pode o presidente, por decreto, passando por cima do Congresso, conceder porte de armas para essas categorias?“, pergunta Bruno.

O Instituto também afirma que há “enorme potencial de piorar a já grave situação da segurança pública no país” e diz que a ampliação do porte de armas para diversas categoriais ocorre “arbitrariamente”.

Um dia após o decreto ser anunciado, os deputados da bancada evangélica da Câmara começaram um movimento de articulação para derrubar o texto. A questão das armas é uma das principais discordâncias dos religiosos no Legislativos em relação ao presidente.

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NOTA PÚBLICA: Novo decreto sobre caçadores, atiradores e colecionadores altera lei de controle das armas no país em detrimento da segurança pública O Instituto Sou da Paz entende como prejudicial ao Brasil o decreto, assinado por Jair Bolsonaro nesta terça-feira, cuja função é facilitar ainda mais o acesso a armas de fogo e munições aos caçadores, colecionadores e atiradores (CACs) e permitir a esta categoria o transporte da arma municiada. Ao possibilitar que mais pessoas andem armadas, o decreto altera a legislação que proíbe o porte de arma no Brasil, cuja mudança só poderia ser feita pelo Congresso Nacional. Com o decreto, o presidente beneficia um pequeno grupo de indivíduos em detrimento da segurança pública – uma vez que há impacto real na sociedade com novas 255 mil pessoas que poderão andar armadas nas ruas com esta decisão. O Exército contabiliza hoje mais de 350 mil armas nas mãos de CACs. São recorrentes os casos de desvio para o mercado ilegal, ainda que não intencionalmente. A própria justificativa usada pelos atiradores para demandar o porte municiado é que eles se tornam alvos preferenciais de roubos, reconhecendo que a arma atrai criminosos. Este é um problema negligenciado há muito tempo, conforme o relatório da CPI do Tráfico de Armas, da Câmara dos Deputados de 2006. Adicionalmente, mesmo com a regulamentação atual, o país já vive uma explosão no número de pessoas que se registram como CACs. As concessões cresceram 879% apenas nos últimos cinco anos, segundo dados oficiais. Ampliar os registros de armas sob essas categorias vai sobrecarregar ainda mais o Exército, desviando-o de suas funções essenciais de Defesa Nacional para que fiscalizem atividades de hobby privado ou esporte. (…) Leia a nota completa: bit.ly/2J953xd

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Recepção do decreto em Brasília

Um dia após o decreto ser divulgado, a Câmara e o Senado apresentaram projetos para revogar o texto. Para os deputados e senadores o conteúdo viola o princípio da separação de Poderes, tirando do Congresso a prerrogativa de legislar. Algumas propostas também afirmam que o decreto viola o Estatuto do Desarmamento, como também afirmou o Instituto Sou da Paz.  

O que acontece é que o texto de Bolsonaro vai contra o artigo do estatuto, que afirma ser “proibido o porte de arma em território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria”e para categorias previstas na lei, como integrantes das Forças Armadas e policiais.

Um dia após o decreto ser anunciado, os deputados da bancada evangélica da Câmara começaram um movimento de articulação para derrubar o texto. A questão das armas é uma das principais discordâncias dos religiosos no Legislativos em relação ao presidente.

De acordo com Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, é padrão que haja uma análise de constitucionalidade para todo decreto presidencial que é assinado, só assim o decreto consegue avançar para o Poder Legislativo.  

Além disso, segundo o advogado Tomás Paiva, doutor em direito constitucional pela USP, em entrevista para o portal UOL, a Constituição não permite que o presidente crie “nada de novo” por meio de um decreto, mas apenas regulamente a execução de uma lei, e tudo que extrapolar isso é nulo e ilegal.

Paiva ainda diz que analisar se o decreto atende a essas condições não é fácil. “O que você tem que fazer é um confronto entre a lei e o decreto. Por exemplo: o decreto não pode revogar um dispositivo da lei, não pode regulamentar ou criar disposições que, no final, acabem por alterar a substância da lei indiretamente. Esse é um confronto que é feito caso a caso”, explica.

De acordo com o Supremo Tribunal Federal, para haver o questionamento de um decreto, é necessário entrar com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). Mas apenas algumas pessoas podem propor essas ações, como representantes de Poderes, governadores, o procurador-geral da República, partidos políticos, o conselho federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e entidades de classe.

Já o Congresso, recebe da Constituição o poder exclusivo de “sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa.  

 

Ministério Público Federal pede suspensão de decreto

Mas tudo isso que vimos está em um passado distante. Dia 14 de maio, o Ministério Público Federal (MPF) apresentou uma ação à Justiça Federal em Brasília pedindo para suspender integralmente o texto de Bolsonaro. Na ação, o MPF disse que o decreto “exorbita sua natureza regulamentar” e contraria o estatuto do desarmamento, colocando “em risco a segurança pública de todos os brasileiros.  

Os procuradores chamaram de “ilegal” a extensão ao direito à aquisição e ao porte de armas para as categorias autorizadas. Segundo os procuradores, a ampliação poderá causar efeitos irreversíveis, já que armas de fogo são bens duráveis.

O curioso é que, o próprio Ministério Público Federal lembrou que o presidente, Jair Bolsonaro, e ministro da Justiça, Sergio Moro, disseram que o decreto não é uma medida de segurança pública e, de acordo com os procuradores, nesse aspecto há razão as manifestações. “O decreto não só não é do interesse da segurança pública como a coloca em risco. […] A liberação – embora tenha como finalidade ampliar o número de titulares de um direito individual e diminuir as restrições para seu exercício – representa um retrocesso no sistema de controle de armas no País”, informam os procuradores.

A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu informações ao governo para poder decidir sobre um pedido do partido Rede de Sustentabilidade que quer a anulação do decreto.

 

O que diz Sergio Moro, ministro da Justiça e Segurança Pública

De acordo com o portal Exame, Jair Bolsonaro não aguardou os pareceres jurídicos da equipe de Sergio Moro, ministro da Justiça e Segurança Pública, antes de assinar o decreto.

Segundo informações, faltava uma hora para a solenidade no Palácio do Planalto quando a consultoria jurídica do ministério recebeu o texto elaborado pela Casa Civil. O prazo, segundo pareceres, era insuficiente para realizar uma análise aprofundada.

No dia 15 de maio, em entrevista à GloboNews, Sergio Moro afirmou que se houver alguma “invalidade” no decreto, caberá ao STF ou ao Congresso Nacional revisar o texto. É natural que ele [o decreto] seja questionado. Dentro desse âmbito da política, sobre essa matéria específica, não existe ali nenhum problema em que haja esse tipo de questionamento. Se houver alguma invalidade, caberá ao Supremo Tribunal Federal ou eventualmente ao Congresso, que tem poder de editar decretos legislativos, fazer uma revisão“, declarou Moro na entrevista.

 

Recuo do governo 

No começo da semana do dia 20 de março, havia um novo tópico do decreto, autorizando o o porte de fuzis. Mas no dia 22 de maio, o governo recuou e publicou um novo decreto sobre as regras para a posse e porte de arma de fogo no Brasil. Entre as alterações anunciadas estão o veto ao porte de fuzis, carabinas ou espingardas para cidadão comuns, além de nova regra na prática de tiro por menores de idade e no transporte de arma em voo.

Ou seja: 

PERMITIDO: armas de porte, como pistolas, revólveres e garruchas.

PROIBIDO: Armas portáteis, como fuzis, carabinas, espingardas, e armas não portáteis.

O que foi alterado, também, foi a idade para menores praticarem tiro esportivo, agora, só poderão a partir dos 14 anos com autorização dos dois responsáveis. Antes da atualização do decreto, não foi estipulada uma idade mínima, sendo exigida uma autorização de apenas um dos responsáveis.

O que gerou muita discussão foi o transporte de armas em voos. O decreto afirmava que essa decisão era do Ministério da Justiça, mas foi transferido para a Anac determinar as regras para transporte de armas nos voos.

 

E a população?

Assim como tudo o que envolve o governo de Jair Bolsonaro, o decreto que facilita o porte de arma divide opiniões. Podemos até entender (ou talvez não) que muitos sejam a favor da posse de arma, já que a função dela será proteger a residência e os moradores, e claro, será guardada em um local seguro. Mas o porte de arma facilitado para algumas categorias gera uma apreensão maior.

De qualquer forma, é importante que o STF e o MPF resolvam se o decreto é ou não inconstitucional, para esse não ser mais um caso de afirma e desmente, afirma e desmente, coisa que, no governo atual, está sendo bem comum.

 

Bolsonaro revoga decreto

No dia 25 de junho de 2019, o presidente Jair Bolsonaro decidiu revogar o decreto que facilitou o porte de armas de fogo, segundo Onyx Lorenzoni, ministro da Casa Civil, após reunião com senadores.

O pacote de mudanças foi alvo de críticas, levando o plenário do Senado a aprovar um parecer da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) que pede a suspensão dos decretos.

 

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