Fellet com Fritas: Farmacinha Natural
Por Carolina Fellet
Dizem que o sol que a gente toma aos seis anos reflete no corpo aos 60. Esse efeito vale para a frase que eu ouvia nas rodinhas de adultos quando eu era criança: “Caminhe uma hora por dia. Sua saúde agradece”. Só agora, aos 33, ela faz sentido na minha cabeça.
Até os 30, achava um tédio gente conversando sobre bem-estar físico e mental a minha volta. “Beba dois litros de água, durma oito horas por noite, saia com os amigos para dar boas risadas”. Os conselhos pareciam sair de narrativas sobre reinos encantados da Disney. E eu confesso: sempre preferi as tramas de Mauricio de Sousa, Pedro Bandeira, Cecília Meireles.
Além do mais, quantos ídolos do rock, da poesia, da pintura eram completos ébrios, sedentários, notívagos e socialmente desastrados?! Nem por isso, deixavam de ser geniais e inspiradores.
Mas, assim que me tornei balzaquiana, passei a entender por que, durante toda a minha infância, adolescência e início da fase adulta me desejavam saúde nos meus aniversários. É que, nas primeiras décadas de nossa vida, ela é gratuita. Depois, é sequestrada e a gente vai pagando o resgate a prazo, investindo em pilates, analgésico, no chinês que é um ás em acupuntura, em nutricionista, médico, psicólogo.
Eis que me rendi à caminhada. Não por amor ao esporte, porque sempre detestei as aulas de Educação Física. Costumava ir de calça jeans para não ter de jogar bola nem levar bolada e corresponder, enfim, ao meu instinto de autopreservação. Eu me rendi à caminhada por dor. Como nas religiões, que a gente busca por dor ou por amor. Comecei a sentir incômodos no pescoço, no cóccix. Aí, recorri à entediante recomendação da infância.
As medalhas que tenho conquistado nada têm a ver com o reino encantado da Disneylândia. Elas são reais. Houve, dentro de mim, a inauguração de uma farmacinha com estoque de endorfina, antiácido, antiestresse, antidepressivo.
Parece que meu corpo ficou pequeno para mim; me tornei muito maior que ele.