Fellet com Fritas: Sinais do Corpo

04 dez | 1 minuto de leitura
Foto: Dudu Mazzei

Sempre amei a música produzida pela árvore genealógica dos Caymmi. Há uns dias, estava ouvindo “O que é o amor”, na voz de Danilo, e a sensação foi de que todos os acordes da canção já existiam em mim; estavam apenas em latência.

O fenômeno se estende aos outros sentidos, como o paladar. Uma vez, provei um docinho de festa cujo ingrediente principal até hoje desconheço, porém aquele sabor parecia estar registrado no meu corpo, em alguma memória gustativa.

Recapitulando os tempos tímidos da puberdade, entro nas águas de uma cachoeira pela primeira vez. Não é que a imensidão líquida me soava familiar? Ouvi-la era como resgatar alguma relíquia submergida no meu fluido interno.

É também na juventude que costumam sequestrar nosso DNA, nossa personalidade, nossa unicidade. Nessa estação da vida, a gente tem de se filiar a alternativas que já eram imperativas antes mesmo de nascermos. Assim, vamos cedendo a comportamentos uniformes, à la linha de montagem, na caminhada para o mundo adulto.

O sintoma que atestou minha entrada nessa fase foi a busca constante e vã pela saída de emergência. “Meu Deus, o que estou fazendo neste lugar com estas pessoas”? Reaparecia em mim a criança que um dia perdeu o rosto da mãe no supermercado e se viu à mercê de estranhos. Só que, depois dos 30, você não é resgatado pelo alto-falante.

Depois dos 30, descobrimos que a redenção fica dentro do corpo. Mas, para alcançá-la, é preciso uma lanterninha. Ela nos permite acessar nossas próprias cavernas e encontrar o grande e misterioso tesouro, que arquiva todas as nossas tormentas, os desapontamentos e nos salva de nós mesmos através de elementos que nos compõem.