Os presídios do Brasil e seus constantes massacres e inúmeras mortes

30 maio | 14 minutos de leitura

A pouca segurança nos presídios brasileiros

O lugar que deveria representar segurança tanto para os presos, quanto para a população, se tornou um caos. Não é de hoje que presídios do Brasil sofrem com rebeliões, mortos, feridos e muita rivalidade no meio disso tudo.

Para entendermos que o problema não é novo, listamos os massacres que chocaram o Brasil, deixando mortos e a sociedade espantada. Confira:

Massacres em presídios no Brasil
Foto: REUTERS

Os presídios do Brasil e seus constantes massacres e inúmeras mortes

 

1952: Rebelião no presídio Ilha Anchieta – 118 mortos

Em 1952, a Ilha Anchieta, em Ubatuba, considerada a Alcatraz brasileira, estava calma, por isso a direção da unidade mandou 117 presos buscarem lenha, acompanhados apenas de dois soldados. Na Ilha, estavam os criminosos mais perigosos da época.

Ao buscarem a lenha, os bandidos renderam um dos soldados, mataram o outro e retornaram ao presídio para colocar em prática o plano de fuga. Houve troca de tiro entre os criminosos e os vigias, só ali, morreram quatro pessoas, com tiros e pauladas.

Segundo militares que trabalhavam na Ilha Anchieta, o plano foi criado pelo preso Álvaro da Conceição Carvalho Farto, também conhecido como Portuga. O tenente da reserva da Polícia Militar Samuel Messias de Oliveira, autor do livro Ilha Anchieta – Rebelião, Fatos e Lendas, em entrevista ao jornal Estadão, diz que Portuga foi ganhando a confiança dos funcionários porque os outros presos estavam apresentando bom comportamento, e o tenente acreditava que era resultado do trabalho de Portuga.

Quando a rebelião começou, os presos dominaram o armeiro e pegaram o arsenal da polícia, que entre outras coisas, tinha quatro metralhadoras e 80 fuzis. As celas foram abertas e os presos considerados “seguros” foram mortos, mas 453 detentos estavam livres.

O tenente Samuel afirma que os presos planejavam fugir em um barco que chegaria no mesmo dia, mas tudo saiu do controle e os criminosos começaram a andar armados pela ilha.

Muitos presos tentaram fugir em uma embarcação pequena, mas devido a quantidade de pessoas, o barco começou a afundar. Os presos jogaram os feridos no mar para aliviar o peso. O tenente Samuel afirma que o sangue dos feridos no mar atraiu os tubarões, e dezenas morreram apenas nesse episódio. Outros foram baleados pela polícia ou pelos próprios criminosos em fuga.

Ao todo, 118 pessoas morreram, sendo 108 presos e 10 funcionários. Três anos após o massacre, a Ilha Anchieta foi fechada e os presos foram levados à Casa de Custódia de Taubaté, onde foi criado o Primeiro Comando da Capital, o PCC.

Massacres em presídios no Brasil
Revista Manchete – 5 de Julho de 1952

1989: 42º Distrito Policial de São Paulo – 18 mortos

Após a tentativa de rebelião no 42º Distrito Policial, na zona leste de São Paulo, 50 detentos foram colocados em uma cela de 1m x 3m, um cubículo sem ventilação.

Após deixarem os presos por cerca de uma hora na cela, os policiais abriram a porta de ferro do local. Nove já tinham morrido por asfixia e outros nove morreram em seguida.

 

1992: Massacre do presídio do Carandiru – 111 mortos

O presídio mais famoso do Brasil também abriga uma das histórias mais violentas que o país assistiu. Em outubro de 1992 uma briga entre presos da Casa de Detenção de São Paulo, o Carandiru, deu início a um tumulto no Pavilhão 9, o mais cheio do local, com 2.070 pessoas. Lá, estavam presos primários, recém-chegados das ruas, que aguardavam condenação.

Após a fracassada tentativa de funcionários em conter os presos, o secretário de Segurança Pública, Pedro Franco de Campos, autorizou a Polícia Militar a invadir o Pavilhão 9, conforme o então governador Luiz Antonio Fleury Filho afirmou. Na ação, foram envolvidos 321 policiais, 25 cavalos e 13 cães.

O coronel Ubiratan Guimarães, líder da tropa que estava presente no Carandiru, foi ferido no tiroteio e retirado do local. Ainda segundo Fleury, um dos motivos que fizeram os policiais perderem o controle da situação, foi a falsa notícia que se espalhou de que Ubiratan tinha morrido.

O segundo andar do Pavilhão 9 foi o que mais deixou mortos, 78. A maioria dos presos foi ferida com tiro, cerca de 102 pessoas, mas muitos também sofreram com perfurações de armas brancas, sendo que 9 morreram de ferimentos causados por essas armas.

O tiroteio dentro do Pavilhão no presídio durou 20 minutos. Quando terminou, a PM ordenou que os presos que sobreviveram tirassem a roupa e fossem para o pátio. Alguns, foram obrigados também pelos policiais a carregarem os mortos para a galeria do Pavilhão.

Foram constatados que 111 pessoas morreram, nenhum policial. Porém, o número de mortos é contestada por vários presos, que acreditam que mais pessoas morreram lá.

Conforme um ex-agente afirma em entrevista ao portal Terra, a tragédia era inevitável, pois a Casa de Detenção estava superlotada há anos e o número de funcionários era insuficiente para controlar os detentos. Conforme seus dados, havia cerca de 1.100 carcereiros, divididos em quatro turnos de trabalho, para vigiar quase 10 mil presos.Massacres em presídios no Brasil

 

2000: Complexo da Papuda – 11 mortos

Uma briga interna de presos no Centro de Custódia da Penitenciária da Papuda deixou 11 mortos, em 2000. Acredita-se que o motivo da confusão foi a morte de um detento, Ananias Elisário da Silva, que era acusado de liderar a maior quadrilha de roubo de cargas do país e de ter matado mais de 40 caminhoneiros.  

Ananias, alguns dias antes, tinha prestado depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do Roubo de Cargas (CPMI), que investigava quadrilhas especializadas em roubo e receptação de cargas em diversas cidades do Brasil. Por isso, os responsáveis pelo caso acreditavam que a morte de Ananias seria uma queima de arquivo, pois ele tinha ameaçado contar detalhes de como funcionava o esquema dos roubos, além de ter citado alguns nomes de donos de empresas que participaram do esquema.  

Após a morte de Ananias, 200 presos portando armas artesanais invadiram o Pavilhão B e colocaram fogo em colchões da cela 1, onde havia 15 presos. Só ali, morreram 11 pessoas, ou queimadas vivas ou sufocadas pela fumaça. O massacre durou apenas 50 minutos.

 

 

2001: Rebelião simultânea em 24 presídios de São Paulo – 8 mortos

O Primeiro Comando da Capital, PCC, liderou uma rebelião simultânea em 24 presídios de São Paulo, em fevereiro de 2001. Cerca de 27 mil presos, quase a metade dos 60 mil condenados que cumpriam pena no Estado, começaram a dominar penitenciárias em 19 cidades. O motivo da rebelião era que eles exigiam o retorno de nove supostos líderes que tinham sido transferidos para uma unidade do interior.

Primeiramente, o motim estourou em seis penitenciárias, a maioria na cidade de São Paulo. Os 7.200 presos da Casa de Detenção e 2.500 da Penitenciária do Estado assumiram o controle dos pavilhões e mantiveram funcionários e familiares de detentos como reféns, já que era dia de visitação.

Após tentativas frustradas de negociação, cerca de 2.000 homens da tropa de choque receberam ordem para invadir. Ao todo, morreram dois presos do Centro de Detenção Provisória do Belém, na zona leste de São Paulo, três pessoas no Carandiru e mais três em Guarulhos.

 

2002: Dr. José Mário Alves da Silva, Urso Branco – 27 mortos

Cerca de 300 internos controlaram a penitenciária Doutor José Alves da Silva, conhecida como Urso Branco, em Rondônia.

Conforme relatos de policiais, as mortes foram provocadas por uma briga entre facções rivais e aproveitando a situação, os presos tentaram fugir. De acordo com informações do tenente-coronel da central de comunicação da PM, alguns detentos eram ligados à facção criminosa Comando Vermelho (CV), irmã do CV do Rio de Janeiro. A partir de 2000, eles começaram a ter conflitos com presos do Paraná que foram para Urso Branco.

Fabiane Andrade, então integrante da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Porto Velho, que teve contato com os detentos, afirma que, durante a madrugada, as paredes das celas onde estavam os presos do “seguro”, que eram ameaçados de morte, foram derrubadas. Após matarem esses presos, os envolvidos na rebelião tentaram fugir, com ajuda de pessoas de fora da prisão.

Segundo informações, o motivo para a rebelião teria sido a determinação da restrição dos detentos no interior do presídio. As mortes em Urso Branco ganharam repercussão internacional pela brutalidade, que envolveu casos de decapitação, choque elétrico e enforcamento.

 

2004: Rebelião na Casa de Custódia de Benfica – 34 mortos

A rebelião que deixou 34 mortos na Casa de Custódia de Benfica, em 2004. A revolta começou por volta de 6h de um sábado, quando o presídio foi atacado por bandidos armados. Pelo menos 14 detentos conseguiram fugir e três foram resgatados.

O grupo atirou contra os policiais nas guaritas e jogou um explosivo que deformou o portão principal, por onde os presos escaparam. Os presos que não conseguiram fugir começaram a rebelião e pegaram 26 pessoas como reféns, entre agentes penitenciários e policiais reformados.

De acordo com informações da Folha de S.Paulo da época, alguns corpos foram mutilados e outros carbonizados. As vítimas seriam integrantes das facções Amigo dos Amigos (ADA) e Terceiro Comando (TC), rivais do Comando Vermelho, que teria liderado o motim.

 

2010: Complexo Penitenciário de Pedrinhas – 18 mortos

Foi em 2010 que 18 presos foram mortos no Complexo Penitenciário de Pedrinhas por um grupo rival em uma rebelião.

 

2016 – Rebeliões em cinco presídios do Ceará – 18 mortos

As rebeliões foram registradas em vários presídios do estado do Ceará e ocorreram durante e após a greve dos agentes penitenciários. De acordo com informações, a motivação para os conflitos foi a suspensão das visitas nas unidades prisionais.

 

2017: Complexo Penitenciário Anísio Jobim – 59 mortos

Em janeiro de 2017, 56 presos ligados ao PCC foram mortos no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus. Os mortos foram assassinados por membros da Família do Norte (FDN).

Alguns dias depois, em Nísia Floresta, região metropolitana de Natal, e pelo menos 26 detentos da facção Sindicato do Crime foram assassinados por integrantes do PCC. Muitas vítimas foram queimadas e esquartejadas.

 

2017: Penitenciária Estadual de Alcaçuz – 26 mortos

A rebelião durou 14 horas e deixou 26 detentos mortos na Penitenciária Estadual de Alcaçuz e no Pavilhão Rogério Coutinho Madruga, em Nísia Floresta. Seis presos foram identificados como responsáveis por liderar a matança. Eles eram integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC), e os mortos eram da facção Sindicato RN.

O motim começou quando detentos do PCC, que estavam no Pavilhão Rogério Coutinho Madruga, invadiram o depósito de armas, pularam o muro e entraram na penitenciária de Alcaçuz, onde os presos da facção Sindicato RN estavam.

Os presos, em Alcaçuz, destruíram bloqueadores de celular e derrubaram a energia elétrica. A polícia só conseguiu entrar quando a cadeia estava parcialmente destruída e os corpos espalhados.

Para remover os corpos, o governo contou com caminhonetes abertas e precisou alugar uma câmara frigorífica para acomodá-los.Massacres em presídios no Brasil

 

2017: Penitenciária Agrícola de Monte Cristo – 33 mortos

Quatro dias depois das mortes em Manaus, 33 presos da Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, Roraima, foram mortos depois de uma rebelião. Em 2018, a investigação ainda não tinha sido concluída, mas o G1 afirma que o massacre foi motivado por uma disputa de controle da penitenciária entre duas facções rivais, o PCC e o CV.

 

2019: Presídios de Manaus – 55 mortos

Foram menos mortos, mas ainda é cruel. O Complexo Penitenciário Anísio Jobim já tinha vivido massacres assim em 2017, quando 59 detentos foram mortos. Dessa vez, 19 presos foram mortos no Anísio Jobim, 25 no Instituto Penal Antônio Trindade, 6 mortos na Unidade Prisional do Puraquequara e 5 no Centro de Detenção Provisória Masculino.

Acredita-se que uma briga de poder dentro da facção Família do Norte foi a causa das mortes. A Secretaria de Administração Penitenciária informou que a maioria das mortes tinham sido por asfixia.

As primeiras mortes foram no Complexo Anísio Teixeira, durante a visitação aos presos. Uma briga nos pavilhões 3 e 5 deixou 15 mortos. Os familiares presenciaram algumas mortes, mas não foram feitos reféns.

O governo estadual autorizou a separação de 200 presos ameaçados de mortes. As celas foram vistoriadas, as visitações foram suspensas, nove presos que seriam os mandantes do massacre foram transferidos para presídios federais e também foi pedido a extensão da presença da Força Nacional em Manaus.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, anunciou o envio de integrantes da Intervenção Penitenciária, que vai ajudar o estado a retomar o controle dos presídios. O ministro também ofereceu vagas a mandantes do massacre nos presídios federais.Massacres em presídios no Brasil

 

Os problemas nos presídios brasileiros

Em 2012, o então ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, afirmou que “preferia morrer” a “ser preso” no Brasil. Ele ainda disse que “quem entra em um presídio como pequeno delinquente, muitas vezes, sai como membro de uma organização criminosa para praticar grandes crimes”.

Camila Nunes Dias e Rosângela Teixeira Gonçalves, do Núcleo de Estudos da Violência da USP, afirmam que a política de encarceramento em massa que o adota há décadas segue no trilho, firme e forte, mas falha extremamente. “As prisões jamais – e em lugar nenhum do mundo – demonstraram eficiência em reduzir o crime ou a violência. Ao contrário, especialmente no Brasil e nas últimas três décadas, elas têm demonstrado o seu papel fundamental como espaços onde o crime se articula e se organiza, dentre outras coisas, através de um eficientíssimo sistema de recrutamento de novos integrantes para compor as redes criminais“, afirmam Camila e Rosângela.

Atualmente, o Brasil possui 704.395 presos, sendo que tem capacidade total de 415.960. Mas se forem contabilizados os presos em regime aberto e os que estão em carceragens da Polícia Civil, o número passa de 750 mil. Os presos provisórios, aqueles sem julgamento, chegam a representar 35,9% da população presa.

Em todos os estados, as cadeias estão lotadas. A maioria comporta o dobro do que suporta. Dos quase 750 mil presos, 18,9% deles trabalham e outros 12,6% estudam.

Na Unidade de Progressão do Complexo Penitenciário de Piraquara, no Paraná, todos os presos estudam e trabalham. São cerca de 300 detentos no local, que possui menos de três anos e já virou referência no país.

A reincidência também é um problema para o sistema carcerário e não só do Brasil, é um problema global. De acordo com a BBC, 70% das pessoas que deixam a prisão acabam cometendo crimes de novo.

Outro ponto que também prejudica o sistema é a saúde precária. Conforme explica a BBC, alguns estudos mostram que os detentos brasileiros possuem 30 vezes mais chances de contrair tuberculose e quase 10 vezes mais chances de serem infectados por HIV (vírus que causa a AIDS) do que o restante da população. Além de serem mais vulneráveis à dependência de álcool e drogas.

Como podemos ver, massacres em presídios, infelizmente, é mais antigo do que pensamos.

Em 2016, a ministra Cármen Lúcia, disse que um preso custa 13 vezes mais do que um estudante, no Brasil. Segundo a ministra, um preso custa R$ 2.400 por mês, enquanto um estudante do ensino médio custa R$ 2.200 por ano.

Por isso, é importante analisar o que há de errado e começar a lidar com esse problema de uma forma mais séria, pois de nada adianta jogá-los em um local para cumprirem uma pena, gastar horrores, gastar mais ainda após rebeliões onde pessoas são mortas e os presídios são destruídos, e o detento sair e após um tempo, retornar. Não, não adianta.

 

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